Tem algumas caixinhas da nossa memória que, sei lá porque razão, ficam fechadas, mesmo que guardem passagens bonitas, agradáveis. Acho que temos mais caixas guardando histórias boas do que ruins, ainda bem, então nem sempre a gente encontra todas, acaba ficando alguma lá atrás, e encontra-la por acaso é um deleite.
Ontem eu achei uma dessas. Alguém que eu sigo no Instagram postou o trecho de uma música que eu não lembrava, mas adorava. Gostava tanto que comprei o disco há vários anos (ou gostava muito de tanto ouvir o disco?). Eu não tenho mais esse disco, onde foram parar nossos discos? Foram todos pra uma dimensão paralela, dos discos físicos que se sentiram colocados de lado? O disco era American Life, de Madonna. Comprei com minha irmã, em um daqueles que eram nossos programas preferidos: comprar discos na Flashpoint, no shopping Barra. Nosso vendedor era sempre Fábio Cascadura, conhecedor de música como só ele. Não sei se ele gostava de vender Madonna. Mas a gente amou tanto aquele disco, não sei como ele foi sumir. Lá a gente comprou alguns de Santana, Silverchair, outros. Essa lembrança já anda empoeirada. Tempo que passa ligeiro.
A música que abriu essa caixinha foi Nothing Fails. Uma beleza. Nada falha, tudo está em seu lugar. “Eu não sou religiosa, mas me sinto tão tocada. Não sou religiosa, mas isso me faz querer rezar”. A pessoa postou essa música diante da imensidão de um mar visto de cima de um penhasco. Esplendoroso. Imagem que faz qualquer um querer rezar em agradecimento.
Eu tenho muito a agradecer. Nas conversas com minha irmã na infância, bem antes das idas à loja de discos, a gente sonhava com o futuro. Como todo mundo no mundo, a gente queria ser rica um dia. Eu não sou rica, olha, tô bem longe disso. Mas eu acabo de perceber que o que eu desejava ter é exatamente o que eu tenho hoje. Uma casa minha, bonita, que me faz gostar de estar nela, uma família que dê vida a essa casa. Poder viajar pelo mundo de vez em quando. Comprar um presente pros meus filhos (que na transição pra realidade virou uma filha ❤️) de vez em quando. Era viver o que eu vivo hoje. Eu nunca sonhei com jatinhos, joias, piscinas de dinheiro. Criança sabe das coisas, brinca com caixa, fica feliz com qualquer troço que lhe traga um sorriso. Então a riqueza daquele sonho, que surpresa, eu tenho demais. Perceber isso hoje, foi a minha versão de estar diante da imensidão de um mar, visto de cima de um penhasco, esplendoroso.
Nada falha.