Archive for Maio, 2012

Paixão, e basta.

Eu sou uma romântica mesmo. Boba por uma história de amor e paixão. Vendo as fotos de um amigo “recém apaixonado”, parei pra pensar que poucas coisas (tem alguma?) são mais loucas e intensas do que a paixão. Quem explica? Quem ousa tentar entender porque, de repente, aquele recém chegado personagem da sua história virou tão indispensável, tão influenciador de seu humor, tão dono de seus pensamentos, tão gerador de tensões, desejos, suspiros, planos, medos, êxtases? Assim, sem mais nem menos? Quem se atreve a me dizer do que é feita essa mistura de sentimentos eufóricos e angustiantes, às vezes sereno, às vezes anestesiante, que faz a gente respirar diferente e sorrir ou chorar, a depender, a depender?

Ah, como eu respeito aqueles que, mesmo sem saber do que se trata, se deixam levar pelas demandas urgentes da paixão. Que confessam, sem medo ou economia, que aquele domínio é dela e de mais ninguém. E que sabem enxergar, mesmo quando ela não é mais assim, tão urgente, que basta ela ir ali e demorar um pouquinho, que toda urgência vai voltar, e que vai faltar o ar, e que vai arder. É querer dar ao outro o que ele quer, é preencher, satisfazer. É se declarar e fazer o coração do outro disparar, ou descansar.

Um viva, simplesmente porque todo dia é dia internacional da paixão, e porque todo dia que alguém se apaixona de verdade merece um brinde.

Um brinde aos apaixonados, vivendo histórias diferentes, lindas e difíceis à sua maneira, porque a paixão, essa danada, não é flor que se cheire.

Aliás, é sim.

Conversa comprida.

As discussões no Twitter podem ser bem interessantes. Dá pra saber um quase-nada sobre quase-tudo, de quase-todo-mundo. Só que tem assuntos que começam lá mas pedem uma reflexão maior do que é possível ter no Twitter. Por isso resolvi ter uma conversa comprida aqui no blog mesmo. E como conversa comprida faz quem quer, como diz meu pai, fiquem à vontade pra interagir aí, porque são alguns assuntos e eu adoro debates.

Eu nem sei por onde começar, mas vamos lá. A “entrevista” de uma “jornalista” da Band a um acusado de assalto e estupro. E de antemão já adianto que esse vídeo é uma ondinha dentro do mar de lama em que vive a programação de TV aberta na cidade de Salvador e, infelizmente, neste país. Então nem dá pra dizer que aquilo ali foi um grande choque, porque é muito parecido com o que a audiência desses programas está acostumada a ver (eu poupo meu cérebro, graças a Deus). Mas este em especial mexeu com muita gente. E eu acho que mexeu porque em algum momento era preciso mexer. Não dá pra engolir todo dia o mesmo sapo sem dar uma engasgada em algum momento.

Muita gente já falou mais e melhor do que eu poderia/gostaria sobre esse vídeo, então quem quiser dê uma lida aqui, ou aqui.

Essa “jornalista” (que Deus tenha misericórdia da minha classe), passou de todo e qualquer limite ético, moral, profissional, constitucional, penal, pessoal e foi parar no fundo do poço. Humilhando a si mesma, à sua profissão (e à minha), o acusado, a emissora em que trabalha, humilhou a polícia, a Justiça… Mas atenção: ela cumpriu o papel de bode expiatório desse “sistema bruto” em que vivemos hoje. De saber que existe na televisão, no horário de meio-dia, corpos dilacerados, estupradores, traficantes xingando a mãe, mulher bêbada arrancando os cabelos de outra bêbada por causa de um cara bêbado que provavelmente bate nas duas, mulher nua sambando sentada na câmera e outras belezas do tipo. Então, mundo cão é aí. E a “entrevista” de hoje, repito, é uma partícula.

Numa realidade um pouco melhor, nem precisa ser ideal, só melhor, a televisão passaria programas inteligentes nesse horário, em que as pessoas estão em casa, TV ligada enquanto se faz almoço, toma banho, conversa rapidamente, discute alguma coisa trivial. Não precisa ser programa cabeção não, um humorístico, um noticiário, um filme, um infantil, um documentário, um musical. Porque tiveram que escolher o pior do ser humano pra lotear a televisão? Depois querem um país decente. Peraí, até o politicamente incorreto (bendito seja) tem limite. E ele tá perdido em algum lugar atrás da ignorância do ser humano.

Aliás, a Band tem trazido uns programas interessantes na sua grade nacional, o CQC, A Liga, Agora é Tarde, eu não lembro todos, mas tenho gostado da programação. Já em Salvador temos gente como essa “jornalista” e uma outra criatura que apresenta um programa no começo da tarde, aquela que tem um carro cujo pneu custa 100 mil reais segundo a própria. Parem o mundo, quero descer.

Do outro lado da história, vem o outro assunto. Escolas públicas em greve há mais de um mês. Quarenta e tantos dias, e contando. Categoria reivindica, governo faz que não ouve, mais de um milhão de alunos da rede sem aulas. O ensino público, que já tem que peitar um milhão de leões por dia, peita mais esse. O leão do descaso. O leão do silêncio. Do nosso silêncio, inclusive. Nosso, da sociedade. Afinal, uma sociedade bem educada, consciente, cidadã, é boa pra todo mundo, certo? Mas a greve nas escolas públicas só diz respeito a quem estuda / ensina nelas? Hum, curioso. Cadê a comunidade exigindo diálogo entre governo e professores? Negociação? Volta às aulas? Por que os “artistas” muito famosos não fazem uso de seu poder agregador pra gerar debate nesse sentido? Não vejo. Ou vejo muito pouco. Não há mobilização.

Mas nós somos brasileiros e não desistimos nunca. Amanhã estaremos todos procurando um novo assunto que gere uma mega polêmica. A gente vive disso, afinal.

E essa chuva hein? (Vamos falar do tempo?)

A menina do espelho

(Para ler ouvindo The Augusteum)

Diante de si mesma, ela chorou. Reconheceu cada uma de suas dores e chorou profundamente. Chorou tanto que se esvaziou de tudo e dormiu. No chão, diante do espelho. Rosto borrado, maquiagem riscando a face de preto. Os olhos agora eram calmos. Ela dormia. E sonhava que acordava exatamente ali, diante do espelho, o rosto borrado. Ela levantava a cabeça, olhava a si mesma no espelho e respirava leve. Enxugou os olhos e se olhou mais de perto. Era tão bonita… fez um carinho no próprio cabelo, como se quisesse cuidar daquela menina aparentemente frágil, mas que caía e levantava sozinha. Era um carinho que dizia “estamos juntas”. Ela, chorosa e triste, e a outra, a menina linda chorando no espelho. E deu um sorriso ainda borrado, ainda triste, mas um sorriso. Ela levantou, olhou a janela. Era um sol de fim de tarde, que deixava tudo meio dourado, e chovia fino, puro ouro. Tão mágico que ela sorriu verdadeiramente, não mais para o espelho. E desceu correndo as escadas daquela casa grande e branca, numa euforia crescente pra chegar à chuva e sentir aquela água correr em seu rosto. E riu, em silêncio, riu com todo seu corpo. E disse a si mesma que era ela e só ela. Que tudo que precisava estava ali. Dentro dela, naquele sonho dourado de paz, serenidade, firmeza como a terra é firme, leveza como o ar é leve, purificador como é a água e transformador como o fogo. Era ali, naquele pequeno pedaço de mundo que ela encontrou dentro dela, que estava a casa de sua alma. Que ela sabia que podia voltar se quisesse. Só dela, só dela. E quando sentiu que era a hora, levantou, fechou os olhos e os abriu, lá em cima, já diante do espelho. Olhou para aquela menina linda, dourada, plena e gigante, sorriu e estendeu a mão para ela. No banheiro de sua casa acordou, levantou, e percebeu tudo imediatamente. O que tinha derramado suas lágrimas borradas de preto? “Tão pouco…” Ela riu de si mesma, e viu o quanto seu farol mudara de direção. Tocou os dedos da menina do espelho e fundiu-se com ela para sempre.

Agora sua alma tinha endereço.