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Precisamos voltar mais vezes

(Para ler ouvindo Attraversiamo – Dario Marianelli)

Hoje eu voltei àquela casa à qual minha alma pertencia. Eu queria saber se eu ainda estava em casa. Queria ver aquela casa, talvez sentir o que senti naquele dia do espelho. Há tanto tempo não voltava lá… já não era mais a mesma pessoa. Ou era? Precisava descobrir. Entrei com cuidado, não era minha. Era um lugar onde eu morava. Continuava linda. Uma casa grande, no meio de uma floresta no outono. Havia folhas dentro, havia muito tempo que ninguém entrava. E lá estava o espelho. E ela dormia dentro dele, a menina. Deitada no chão. Sentei diante dela, que acordou suavemente. Nos olhamos, nós duas – e só nós duas – sabíamos de tudo. Tanta coisa tinha acontecido, ela acompanhou de lá, de longe. Eu tinha ido lá pra convidá-la a voltar, a sair do espelho. Precisava muito dela. Precisava ser um pouco do que eu era antes. Ela precisava continuar a viver, e viver outras histórias. Começou mais uma vez a chover, mas desta vez uma chuva mais forte. Escura. Fui à janela e ela já estava ao meu lado. Amamos a chuva. E o cheiro da chuva, aquele cheiro que pertencia àquele lugar maravilhoso. Foi diminuindo, diminuindo e virou uma chuvinha fina, que a luz do sol mais uma vez transformou em ouro. Nos fundimos novamente. Agora voltaríamos a ser uma só. E precisaríamos descobrir como seríamos a partir dali. Ela me deixaria mais suave. Eu a faria forte. Éramos eu e ela a mesma pessoa, mas eu precisava busca-la. Antes de descer olhei mais uma vez no espelho. Lá estava uma mulher que era também a mesma menina. E a casa já estava limpa.

“Precisamos voltar mais vezes”.

chuvadeouro